domingo, 29 de janeiro de 2017

UMA ENTREVISTA COM UMA SOBRINHA-NETA DO DR. BEZERRA DE MENEZES

D.a Fausta Bezerra Silva reside num belo casarão da rua General Rodrigues n.° 24, na Estação do Rocha, no Estado da Guanabara. Ê professora aposentada pela ESCOLA PROFISSIONAL PREFEITO BENTO RIBEIRO e casada com o Sr. Zeferíno Silva, alto funcionário aposentado da Câmara Federal. Recebeu-nos irmãmente. Colocou-nos à vontade. O ambiente do seu Lar tem a quietude de um Templo e infunde respeito e emoção a quem lhe penetra o interior. Vive o clima superior, porque seus autores oram e vigiam e vivem, na prática, os Ensinos de Nosso Senhor Jesus Cristo, certamente inspirados nos exemplos do saudoso Presidente da CASA DE ISMAEL. O Sr. Zeferino Silva é um velhinho simpático e inteligente mas agnóstico. Ri, sem maldade, da nossa convicção de Espirita. Ainda não CAIU EM SI, como acontecera conosco e tem acontecido com quantos, péla dor ou pelos fatos, científica- mente comprovados, CAEM EM SI no clima do arrependimento e, vestindo-se de humildade, tudo traduzem das coisas maravilhosas e santas da Verdade, que Deus lhes reserva. D.a Fausta é uma simpática velhinha refletindo mansuetude e bondade nos olhos e nos gestos. Além do mais, vivendo os seus setenta e quatro anos e aparentando ter apenas 60, possui um Espírito sensível e os dons da vidência e audiência. E isto desde criança, motivo por que o Dr. Bezerra de Menezes lhe dedicara particular estima e a apelidara de FAUSTEZA, — coisa que ninguém o fizera jamais. Conversamos, por meia hora, assunto variado. Dialogamos com o Sr. Zeferino. Procuramos mostrar-lhe, véladamente, as Vidas Sucessivas justificando as desigualdades em todos os ângulos de nossa vida. Espírito delicado e culto, percebeu, incontinente, nossa convicção como fruto de estudo e sofrimento e calou-se. Deixou a palavra livre com sua digna esposa. Ouvimos, então, D.a Fausta falar por duas horas seguidas. Ficamos encantado e emocionado com o que nos revelou. Mentalmente, íamos guardando seus informes, seus casos, suas observações, seus preciosos esclarecimentos com relação à vida exemplificativa ao seu bondoso tio e avô. Soubemos que o Dr. Adolfo Bezerra de Menezes nasceu no RIACHO DO SANGUE, no Estado do Ceará, na madrugada de 29 de agosto de 1831. Foram seus pais: o Coronel Antônio Bezerra de Menezes, que era Capitão das Antigas Milícias e Tenente-Coronel da Guarda Nacional, fazendeiro de grandes recursos financeiros, e D.° Fabiana de Jesus Maria Bezerra. Eram verdadeiras almas gêmeas. Dois grandes corações, caritativos por índole. Traziam da Espiritualidade expressivos lastros de Bondade e Renúncia, Humildade e Fé. O ambiente era de emoção. D.° Fausta sente e também sentimos, entre nós, a presença do formoso Espírito de Bezerra de Menezes. Ficamos alguns minutos silenciosos, sentindo intraduzível bem-estar. Ele, com sua presença, aplaudia nossa visita e aquilo que estávamos colhendode sua vida e de seus venerandos pais. D.a Fausta levanta-se. Vai ao interior de sua casa e, depois de breves momentos, volta com alguns livros e anotações. Senta-se e fala-nos: Aqui estão registados vários Casos Lindos, constantes do livro LOUCURA SOB NOVO PRISMA, onde ele estuda, como poucos, as obsessões ocasionadas pelos Espíritos e os meios evangélicos para as melhorar ou solucioná-las; A CASA ASSOMBRADA, romance de caráter espírita, escrito num estilo familiar e com um enredo simples e cativante, descrevendo belas verdades dos nossos sertões nordestinos de há muitos anos; O VALIOSO AUTÓGRAFO, como o publicou a revista O REFORMADOR e, depois, editado pela Livraria da Federação Espirita Brasileira com o título — UMA CARTA DE BEZERRA DE MENEZES, cujo original lhe foi enviado pelo saudoso Poeta Juvenal Galeno. Trata-se, de fato, de valioso documento, verdadeira Tese Doutrinária, em que, confrontando o Cristianismo e o Catolicismo à luz do Espiritismo, nos demonstra sua vasta cultura. Dirigiu-a a seu irmão Germano. Aqui estão, ainda, os apontamentos tirados dos trabalhos do Dr. Canuto de Abreu, publicados na Revista “METAPSlQUICA”, de São Paulo, e alguns outros baseados no romance — BEZERRA DE MENEZES, “o Médico dos pobres”, do Sr. F. Acquaronne. — Não conheço ainda seu livro (referia-se a nós). Mas sei que registou Lindos Casos e todos autênticos, porque lhe foram contados pelo culto Sr. Manuel Quintão, que os ouviu de Pedro Richard, que conviveu, mtimamente, com Bezerra e dele herdou as qualidades de verdadeiro cristão. Aqui nesta sala, principalmente, nos anos de 1898 a 1900, ouvi belíssimos epsódios aã vida de meu querido tio e avô contados pelo meu pai, Dr. Teófilo Rufino Bezerra de Menezes e pelos queridos amigos, Drs. João Lacerda e Maia Lacerda. Meu pai era sobrinho e meu avô, Dr. José Joaquim Bezerra de Menezes, era irmão do Dr. Bezerra, motivo por que sou dele sobrinha e neta. Guardei, pois, bem na memória e no coração aqueles emocionantes epsódios e, depois, quando já moça, procurei me inteirar de sua veracidade e, conseguindo, comecei a votar uma profunda e sincera admiração ao Espírito caridoso do MÉDICO DOS POBRES. Certamente sentindo minha sincera admiração, começou a aparecer-me, a falar-me, possibilitando-me muitas graçasi Somente o chamo quando o problema é muito grave. O nosso Áureo, aqui presente, foi um beneficiado de suas graças. De uma feita, apareceu-me aflito, dizendo-me estar vivendo momentos sérios. Seus problemas eram muitos, morais e financeiros. À proporção que me revelava alguns, senti a presença do Dr. Bezerra, que me dizia: ele não deve mudar, se o fizer piorará sua situação espiritual... Áureo ficou admirado, pois ainda não me havia falado do seu desejo de mudarde casa. Mostrou-se satisfeito, tanto mais quanto me visitara para obter um conselho sobre o que deveria fazer, se ficar ou sair. A situação estava complicada. Mas ele havia conseguido dar ao seu lar um clima de defesa depois de muitos anos de luta. E agora... Finalmente, passado meses, soube que havia mudado e sua situação espiritual e mesmo econômica piorou muito... Ultimamente, vem procurando contornar a situação e vai conseguindo-a, em parte... Nosso caro irmão Áureo, num riso melancólico, confirma, com um, sinal de cabeça, o que diz D.a Fausta. A querida sobrinha-neta de Bezerra continua seus preciosos informes. Nosso Áureo possui outros Lindos Casos, mas apenas mais outro lhe contarei, para não tomar grande e enfadonha minha entrevista. Sua irmã, Maria Pessoa Tavares, apareceu-lhe, de uma feita, de maneira diferente, falando-lhe coisas esquisitas... Foi dada como louca. Médicos foram chamados. Remédios lhe foram receitados. E tudo em vão. Por intermédio de meu genro, Professor Hugo Leite, Áureo me procurou. Vinha com a fisionomia abatida pelas vigílias realizadas junto à irmã, que, dia a dia, piorava. Pedia, com humudaae e fé, vara eu consultar o Espírito do Dr. Bezerra. Seria uma cariaade imensa que lhe fazia e também à sua irmã e aos seus familiares. Ficamos os três em concentração, depois de havermos feito a Prece. E o Espírito de meu caro tio e avô veio e disse: — Não está louca como vocês pensam. Tem algo espiritual adoecendo-a. A entidade não sabe o mal que lhe faz. Vamos, por misericórdia da Virgem, tentar doutriná-la com amor. E vocês tratem do fígado de nossa irmã Maria, porque é isto que está agravando mais a sua suposta LOUCURA. Daqui há um mês, se Deus quiser, estará boa. E de fato, submeteu-se a um tratamento especializado no fígado e, em seguida, começou a melhorar. Um mês depois estava, totalmente, normalizada, como está até hoje, com surpresa de seus médicos assistentes... Aproveitamos uma pausa na palestração utilíssima de D.a Fausta e lhe perguntamos sobre a veracidade dos Lindos Casos que nos contaram, principalmente, Manuel Quintão e Dr. Guil- ton e aqui registrados, páginas adiante. E, além de confirmá- -los, à proporção que deles se inteirava, disse-nos: — O Caso, por exemplo, do anel de grau, ele o deu, como o Sr. relata, a um senhor, ralado de sofrimento, à porta da Federação. No consultório da FARMÁCIA HOMEOPÁTICA CORDEIRO, o que ele deu a uma senhora, mãe, com uma filha doente, ambos pobres e famintos, foi um envelope com o dinheiro que o bondoso Cordeiro coletara, na véspera, para dá-lo a D.a Cândida, a segunda e também virtuosa esposa do Dr. Bezerra. Essa coleta era resultante das consultas pagas pelos clientes que se achavam em condições de o fazer. Cada consulta custava apenas cinco mil réis...Depois de nos contar outros casos lindos de suas anotações, historiou-nos a vida do caroável Seareiro Espírita, através de sua infância trabalhosa, quando para o Rio viera ma- tricular-se na Faculdade de Medicina, justamente quando seus caros pais já se achavam com parcos recursos financeiros. Rememora-nos a renúncia de Bezerra pelos bens materiais, sua paixão pelo dever de servir sem ser servido, de ser útil, de amar a seu próximo, sua preocupação de aliviar-lhe as dores, solucionar-lhe os problemas, dando de si sem pensar em si. E cita-nos, a esmo, o seguinte caso para colaborar com seu asserto: — Quando era Presidente da Companhia de Carris Urbanos, deixava, certo dia, o consultório dessa Companhia, na rua Sete de Setembro. Eram seis horas da tarde. Era sempre o último a sair e somente o fazia depois de assistir ao fecha* mento das portas. Ia descer a via pública, em direção ao Largo São Francisco, onde iria tomar o bonde para sua casa, quando encontrou um velho conhecido, que o aborda todo trêmulo e envergonhado: — Que é isso, meu caro? Que sucedeu com você? O irmão em sofrimento, com a fisionomia refletindo grande mágoa, conta-lhe que acabara de perder o filho e que, desempregado e sem recursos, vinha precisamente para lhe falar... Bezerra não lhe pede outras explicações. Chamo-o para um canto e dá-lhe a carteira e sem procurar saber quanto a mesma guardava... O irmão, emocionado e em pranto, agradece-lhe e parte. Já instalado no bonde, mete Bezerra os dedos nos bolsos e verifica que está sem um níquel... Salta, calmamente, e se dirige a uma casa comercial conhecida sua, ali por perto, onde pede tresentos réis para a passagem. .. Assim era Bezerra de Menezes, continuou D.a Fausta. Concluíra seu Curso de Medicina em 1856, aos 25 anos de idade. Dois anos depois, casou-se por amor, com D.a Maria Cândida de Lacerda. Deste casamento nasceram-lhe dois filhos, um dos quais morreu muito moço e quando frequentava a Faculdade de Direito de São Paulo. Em 1863, cinco anos depois, ficou viúvo. E, dentro do seu desalento, deixava cair do seu coração torturado essas palavras: “As glórias mundanas, que eu havia conquistado, mais por ELA do que por mim, tomaram-se-me aborrecidas, senão mesmo odiosas.. " Em 1864, um ano depois, reeleito Vereador, casara-se em segundas núpcias, com D.a Cândida Augusta Lacerda Machado, irmã materna de sua primeira mulher e de quem teve cinco filhos: Hilda, Maria, Evangélina, Octavio, apelidado de o BARÃO e Francisco, desencarnado, no ano passado, e que possui um filho de nome Adolfo, servindo no corpo consular da Suíça. Todos os seus filhos estão desencarnados. O Octavio, o BARÃO, é justamente aquele com o qual o senhor se encontrou em Miguel Pereira, como me contou e relata em seu livro.O Dr. Bezerra viveu aqui perto de nós, ali na rua Vinte e Quatro de Maio, esquina aà rua, hoje, Filgueiras Uma. Mais adiante está a Farmácia HOMEOPÁTICA FILGUEIRAS LIMA, que no seu tempo se chamava CORDEIRO. No lugar de sua casa, estão hoje a Padaria Iolanda e o prédio dos Correios e Telégrafos. Chegava da cidade, por volta das 14 horas, e ia, ali, atender aos seus inúmeros clientes, na maioria pobres, que nada lhe davam senão a estima e a bênção das Preces. O mesmo havia feito na parte da manhã no seu consultório da rua Primeiro de Março. Muitas vezes, era chamado para atender aos pobres do morro, na maioria mulheres em estado de gestação. A todos dava o remédio da sua bondade exteriorizada nos abraços, no olhar e nos conselhos. Jamais me esquecerei de sua voz e do seu olhar. Quando falava e olhava, emocionava. Em tudo punha algo do coração formoso. Tive esta graça, qual a de merecer muitos afagos de suas mãos e de seus olhos verdes e refletindo a candura das crianças. Quando desencarnou, contava eu doze anos de idade. No dia 10 de abril de 1900, às vésperas de seu desencarne, pedi à minha mãe para me levar à sua casa. Sabia-o gravemente enfermo. Aqui e pelos morros havia um clima ae tristeza. Todos sentíamos que íamos perder o nosso grande Amigo, o querido Médico dos pobres, o Anjo encarnado da caridade, um dos raros discípulos ae Jesus, quando o Espiritismo codificado contava seus 43 anos de consolações. Ainda me lembro, emocionada. Penetrei em seu quarto ornado de uma cama e outros móveis simples e senteime numa cadeira junto à sua cabeceira. OUiou-me e sorriu. Não falava. Somente, minutos antes de seu desencarne, voltou-lhe a voz e mesmo assim, como desejara, para orar à Virgem, de Quem foi devoto sincero e humilde e agradecer-Lhe os socorros, a assistência, o amor imenso de MSe querida. Aquela cadeira tomou-se histórica. Desejei guardá-la e não o consegui. Senti muito. Nela sentaram-se infinidades de pessoas, ricas e pobres, sãs e doentes, visitando-o nos seus últimos momentos. Diante da serenidade, do testemunho que nos deu de resignação na sua enfermidade, congestão cerebral agravada com a anasarca, todos choravam, evangelizados com aquela página de luz e dor, de humildade e fé. O ambiente que possibilitou, mesmo naquela conjuntura, foi de emoção e cura, até para ãj p|jg doentes, do corpo e da alma, a procuravam no leito da agonia. E saíam, dali, melhorados. Aquela cadeira registou prantos e milagres, vibrações sinceras e piedosos agradecimentos. No dia seguinte, às 11 horas e meia da manhã, como um justo, entregou sua alma ao Criador. Seu enterro foi uma apoteose. Gente dos morros, da cidade e dos subúrbios, homens e mulheres, levaramlhe o corpo, a pé, daqui até ao cemitério São Francisco Xavier, no Caju. Está enterrado logo na entrada, ao lado direito da Capela. Há sempre flores no seu túmulo. Flores aos corações agradecidos ao Apóstolo da Bondade nas terras do Brasil! • o D.a Fausta terminou de falar. Um silêncio se fez. E a música do pranto, doce porque saudoso, enchia o ambiente de algo diferente. Um bem-estar imenso sentíamos todos. Levantamos. Beijamos, respeitosa e agradecidamente, as mãos da veneranda sobrinha-neta do querido Kardec brasileiro. Em seguida, abraçamos seu digno esposo, Sr. Zeferino Silva, também agradecida e fraternalmente. Cumprimentamos sua prendada filha Otília e acarinhamos sua netinha Maria Helena. Despedimo-nos do prezado irmão Áureo, desejando-lhe que Jesus lhe pagasse em bênção o bem que nos proporcionou. E saíamos trazendo flores no coração, flores do coração do Apóstolo brasileiro. Cá fora, a tarde caía aos poucos. Um sol adolescente sumia no horizonte. Eram, justamente, 18 horas; era a Hora do Ângelus. Geraldo de Aquino, pela Rádio Copacabana, dizia para os céus do Brasil a Prece da AVE-MARIA! Ajoelhamos o coração e entramos na onda feliz da Hora Sagrada e gratulatória Àquela que é a Mãe das mães e a Quem Bezerra de Menezes sempre se dirigiu e se dirige, como somente ele sabia e sabe orar, na linguagem do coração e do pranto, a favor de todos nós, seus irmãos em provas remissivas, na glória do BOM COMBATE, com Jesus e por Jesus, em busca do Amor único de Deus, Pai e Criador! Rio, 9 de agosto de 1962.

sábado, 21 de janeiro de 2017

Masturbação á luz do Espiritismo


Pelo Espírito Eugênia por meio da mediunidade de Benjamim Teixeira 

Pergunta – Eugênia, seria abusivo perguntar sobre masturbação?

Resposta – Claro que não. A forma de me perguntar já revela a necessidade de se ventilar a temática. Tudo deve ser falado, sob a perspectiva da Espiritualidade, principalmente o que é foco de tabu, porque, então, os automatismos neuróticos e destrutivos, bem como as fixações culturais e sociais, agem mais livremente a prejuízo de comunidades e indivíduos.

Pergunta – No passado, Eugênia, tratava-se a masturbação como pecado ou como desequilíbrio que até poderia causar distúrbios mentais e físicos. A medicina (auxiliada pela psicologia e pela sexologia) eliminou os fundamentos de tais crendices populares (que tiveram muito apoio de gente instruída, em tempos idos), mas, no meio espírita, ainda se considera a masturbação como vampirismo ou desvio de função das energias sexuais, um desperdício, qual se todo ato masturbatório indicasse uma queda em tentação. Poderia nos falar algo sobre estas considerações?

Resposta – Sim. É gritantemente necessário que o postulado básico de acompanhar a ciência seja lembrado entre aqueles que desejam, sinceramente, desposar o Espiritismo como filosofia de vida. Apegar-se a velhos conceitos, por tradição, por medo de enfrentar o novo ou por receio de ser plenamente responsável pelos próprios atos, é de tal modo descompassado com a modernidade, que nos eximimos de expender mais comentários a respeito. Importante lembrar que médiuns acabam filtrando, inconscientemente, o pensamento das entidades que se manifestam por seu corpo mental, de modo que refrações sutis e graves podem se dar (e se dão sempre, em algum nível). Eis por que a vigilância deve ser acentuada, sobremaneira quando condicionamentos culturais e convenções muito cristalizadas estão envolvidos.

O que tem dito a ciência sobre o assunto? Que a masturbação é algo natural e até desejável para o indivíduo adulto; e que, mesmo entre aqueles que já têm a vida afetiva disciplinada nos corredores da educação conjugal, é compreensível aconteça o fenômeno do onanismo (para os dois gêneros), que se revela mesmo imperioso, amiúde, quando os ritmos sexuais dos parceiros não se alinham, a fim de que um não incomode o outro na satisfação de suas necessidades de fundo psicofisiológico, nem alguém se frustre na quota de libido que lhe não seja possível imediatamente canalizar para atividades não-sexuais, sem gerar recalques indesejáveis.

Seja na tenra idade, seja em idade avançada, para solteiros ou casados, hétero ou homossexuais, o fenômeno masturbatório pode ser comparado à ida ao banheiro para a excreção dos detritos alimentares. Há abusos, sem dúvida, como os há em tudo na existência humana. Os ritmos sexuais podem ser exacerbados, na compulsão, ainda que se não tenha parceiro para a prática. Cada caso é um caso, e, somente com profundo autoconhecimento, a criatura descobre o sistema apropriado ao seu modo de ser, em função do bem-estar geral, da produtividade, da criatividade e do sentimento de equilíbrio íntimo, que constituem alguns dos resultados da vida sexual resolvida.

Quanto ao vampirismo, pode acontecer também na vida afetiva a dois, sempre que os desajustes da perversão e da promiscuidade invoquem, para a alcova do casal, presenças extrafísicas de baixo calão vibratório, pelo próprio diapasão de desequilíbrio em que se expressam em seu momento de intimidade.

Pergunta – Que bom, Eugênia! Creio que estas suas colocações esclarecedoras vão ajudar muitas pessoas. Entretanto, você aludiu a “perversão”, e este conceito me parece muito amplo e difuso, pelo mesmo motivo de os preconceitos adentrarem este departamento valorativo. Temos muita dificuldade em aceitar e conviver com nosso lado animal, e muitos são os que têm vergonha e não se soltam em funções elementares de sua própria fisiologia, tudo tendo como sinal de depravação, primitivismo e imoralidade. O que você quis dizer por “perversão”? Digo, porque, inclusive, na temática “masturbação”, está em jogo, normalmente, o fator “fantasia”, que pode incluir itens que não sejam desejados também na relação concretizada a dois – estou certo?

Resposta – O tema é muito complexo, e, sem dúvida, não o esgotaremos nesta nossa primeira fala a respeito. Por outro lado, não somos autorizados por Nossos Maiores, ainda, a discorrer abertamente sobre o assunto, porque mentes menos amadurecidas, levianas, despreparadas para nos ouvir, poderiam fazer mau uso de nossas afirmações. O que podemos dizer é que tudo que lese física, emocional ou moralmente alguém pode ser enquadrado no capítulo “perversão”, ao passo que tudo quanto promova o bem-estar biopsíquico, o crescimento psicológico e a boa relação entre as criaturas não pode ser considerado como distúrbio moral ou patologia psíquica.

O quesito “fantasia” é ainda mais intrincado, porque, freqüentemente, melhor que se liberem certos conteúdos indesejados (e ainda não de todo domesticáveis) da psique, por meio das ferramentas imagéticas, do que fazê-los colapsarem no próprio comportamento, em surtos que se chamam, em psicologia junguiana, de “possessão pela sombra” (*). Os princípios de civilização, entretanto, devem sempre reger tais processos mentais, na promoção da educação e da melhoria progressiva dos indivíduos, dos mais ínfimos aos maiores gestos, dos mais secretos aos públicos. A gerência de tais impulsos – que, como disse, não podem, em sua totalidade, ser de pronto sublimados – corre por conta da responsabilidade de cada um, em função do próprio e do bem comum.

Pergunta – Algo mais desejaria dizer, por ora?

Resposta – Que se procure, em tudo, o ponto de vista do bom senso, do equilíbrio, da visão de conjunto, e dificilmente se incorrerá em erros graves de conduta, seja consigo mesmo, seja nas relações interpessoais.